Segundo a noção de contrato social, a sociedade foi instituída pelos seres humanos por meio de um pacto coletivo - um contrato -, com base no qual os indivíduos convivem. O contrato estabelece regras e leis, assim como um poder que organiza a coletividade e atua como árbitro nas disputas entre seus membros. As filosofias baseadas nessa ideia ficaram conhecidas como contratualismo ou jusnaturalismo.
O primeiro grande filósofo contratualista foi Thomas Hobbes. Preocupado com a situação política da Inglaterra, agitada pela disputa entre os defensores da monarquia e os que desejavam instituir uma república, ele escreveu duas obras políticas: Sobre o cidadão (1642) e Leviatã (1651). Nelas, Hobbes defende um governo monárquico e absolutista, e em meio a sua argumentação desenvolve a ideia de contrato social.
Hobbes se afasta de Aristóteles, para quem os seres humanos seriam naturalmente sociais. Segundo Hobbes, a natureza humana é individualista e egoísta, e os seres humanos não viveram sempre em comunidade. Se resolveram viver em agrupamentos sociais organizados, foi simplesmente para garantir a sobrevivência. Antes dessa organização, segundo parte dos contratualistas, os seres humanos viviam em um "estado de natureza", ou seja, de modo primitivo. No caso de Hobbes, esse estado é apresentado como uma guerra constante de todos contra todos, o que o levou a dizer que "o homem é o lobo do homem".
Cada um queria impor sua vontade, e todos desejavam acumular bens. Como não existia uma regulamentação sobre o direito de propriedade, vencia o mais forte, seja no sentido físico ou intelectual. Ninguém se sentia seguro, era preciso estar sempre em vigília. Portanto, ainda segundo os filósofos contratualistas, os indivíduos se cansaram de viver dessa forma.
Segundo Hobbes, o pacto social foi feito para selar a paz entre as pessoas, garantindo a cada indivíduo o direito de viver e acumular bens, sem o medo constante de ser roubado ou assassinado. E o pacto seria justamente a abdicação da liberdade natural de cada um em nome da segurança de todos. Os indivíduos se reúnem e pactuam que dali por diante viverão todos sob as ordens de um único chefe, que tem a responsabilidade de garantir a segurança de todos. Para isso, ele cria leis que regulamentam a vida naquela comunidade e servirão para arbitrar disputas entre membros do grupo.
De acordo com Hobbes, antes do contrato social não há povo, há uma multidão, que não é um corpo político, pois não tem uma unidade. É o pacto coletivo que transforma a multidão em povo, em uma unidade política em torno de um projeto comum: a garantia da sobrevivência e do direito de propriedade. Para esse filósofo, uma vez feito o contrato os indivíduos já não podem desistir dele, exceto se o soberano já não for capaz de garantir a segurança e a vida de todos, pois foi em nome disso que se realizou o pacto.
As ideias políticas de Hobbes estão presentes nas monarquias absolutistas europeias dos séculos XVII e XVIII. Entretanto, a situação política da Inglaterra e depois toda a Europa tendeu para uma política liberal, que contribuiria para formar monarquias constitucionais, Estados republicanos e democráticos. No plano do pensamento político, sua ideia de contrato social teve vida mais longa e serviu de matriz para outras teorias políticas.
O pacto e o direito à propriedade
Assim como Hobbes, o médico, filósofo e político Jonh Locke se apoiou nas ideias de estado de natureza e contrato social para construir sua filosofia política. Locke defendia uma monarquia parlamentarista, na qual o poder estaria no Parlamento, nos representantes da população, e não na realeza. Esse sistema foi instaurado com a Revolução de 1689, sendo John Locke um dos que contribuíram com sua fundamentação teórica.
Como você já estudou, embora tenha sido influenciado por Descartes, Locke discordava de ideias inatas. Discordava igualmente da existência de um poder inato ou de origem divina. Para ele, todo poder vem do povo. A teoria de Hobbes ajudou-o a desenvolver essa ideia, mas, contrariamente a Hobbes, Locke não via nesse estado uma guerra permanente. Segundo Locke, o fato de os homens viverem na mais absoluta liberdade não implica que vivessem sem leis. No estado de natureza os homens seriam governados pela lei natural da razão, sendo seu princípio básico a preservação da vida. Portanto, as pessoas não agrediam nem matavam indistintamente, apenas para impor sua vontade ou tomar a propriedade de alguém.
De acordo com Locke, todo indivíduo já nasce proprietário de seu corpo e de sua capacidade de trabalho. Tudo aquilo que produzir, retirando da natureza ou transformando, por meio de seu próprio trabalho, será de sua propriedade, uma vez que empenhou seu corpo e sua vida nessa tarefa. Portanto, em seu estado natural os seres humanos, além de gozarem da plena e absoluta liberdade, podem ter acesso a propriedades. O que os teria levado, então, a abandonar esse estado, instituindo a sociedade civil.
Como o tempo, o produto do trabalho humano e o acesso à propriedade se tornaram mais complexos. Em determinado momento, passou a ser necessário arbitrar sobre os direitos, devido às disputas que começaram a surgir entre os indivíduos. Se todos são iguais, quem é o verdadeiro proprietário dos produtos do trabalho? Se todos são iguais, quem pode arbitrar as questões para fazer justiça?
Os indivíduos reuniram-se em comunidade, diz Locke, com o objetivo de facilitar o gozo do direito de propriedade que, mesmo possível, era incerto e inseguro quando se vivia em estado natural. Para o filósofo, portanto, o principal objetivo do contrato social é a preservação do direito de propriedade.
O pacto entre os indivíduos institui a sociedade civil e o Estado. Para Hobbes, o contrato é um pacto de submissão que visa a instaurar uma situação contrária àquela que vigorava no estado de natureza, preservando a segurança das vidas humanas; já para Locke o contrato se configura como um pacto de consentimento em que os indivíduos, longe de se submeterem todos a um poder comum, concordam em instituir leis que preservem e garantam tudo aquilo que eles já desfrutavam no estado de natureza. O contrato social é, para Locke, a garantia dos direitos naturais, e não a criação de outros direitos.
Locke exemplifica com um tipo bem corriqueiro de associação civil: o casamento. No casamento, dois indivíduos consntem na união, e só por isso ela é possível. O mesmo se aplica ao Estado.
Sendo fruto do consentimento de todos, a instituição de uma sociedade política não significa uma renúncia à liberdade individual, mas sim a instauração de uma nova forma de liberdade, a liberdade civil, que não se contrapõe à liberdade natural, mas a preserva e a amplia. Os direitos naturais se tornam políticos.
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