terça-feira, 12 de maio de 2015

Inteligência e pensamento

A inteligência colhe, recolhe e reúne os dados oferecidos pela percepção, imaginação, memória e linguagem, formando redes de significações com as quais organizamos, ordenamos e damos sentido a nosso mundo e nossa vida. O pensamento, porém, vai além do trabalho da inteligência: abstrai (ou seja, separa) os dados das condições imediatas de nossa experiência e os elabora na forma de conceitos, ideias e juízos, estabelecendo articulações internas e necessárias entre eles pelo raciocínio (indução e dedução), pela análise e pela síntese. Formula teorias, procura prová-las e verificá-las, pois está voltado para a verdade do conhecimento.
Um conceito ou uma ideia é uma rede de significações que nos oferece:
. o sentido interno e essencial daquilo a que se refere;
. os nexos causais ou as relações necessárias entre seus elementos, de sorte que por eles conhecemos a origem, os princípios, as consequências, as causas e os efeitos daquilo a que se refere.
O conceito ou ideia nos oferece a essência-significação necessária de alguma coisa, sua origem ou causa, suas consequências, ou seus efeitos, seu modo de ser e de agir.
O pensamento expressa os nexos ou ligações dessas redes de significações por meio dos juízos, pelos quais estabelecemos os elos internos e necessários entre um ser e suas qualidades, propriedades e atributos, assim como entre o ser e aqueles predicados que lhe são acidentais e que podem ser retirados sem que isso afete seu sentido e sua realidade.
Um conjunto de juízos constitui uma teoria quando:
. estabelecem-se com clareza um campo de objetos e os procedimentos para conhecê-los e enunciá-los;
. organizam-se e ordenam-se os conceitos;
. articulam-se e demonstram-se os juízos, verificando seu acordo com regras e princípios de racionalidade e demonstração.
Teoria é explicação, descrição e interpretação geral das causas, formas, modalidades  e relações de um campo de objetos, conhecidos graças a procedimentos específicos, próprios da natureza dos objetos investigados.
O pensamento elabora teorias, ou seja, uma explicação ou interpretação intelectual de um conjunto de fenômenos e significações. Por isso falamos em teoria da relatividade, teoria genética, teoria psicanalítica, etc.
Uma teoria pode ou não nascer diretamente de uma prática e ter ou não uma aplicação prática direta, mas não é a prática que permite determinar a verdade ou falsidade teórica, e sim critérios internos à própria teoria. A prática orienta o trabalho teórico e verifica suas conclusões, mas não determina sua verdade ou falsidade.
O pensamento propõe e elabora teorias e cria métodos.
O método como regulador do pensamento: Usar um método é seguir regular e ordenadamente um caminho por meio do qual um objetivo é alcançado. No caso do conhecimento, é o caminho ordenado que o pensamento segue por meio de um conjunto de regras e procedimentos racionais, com três finalidades:
. conduzir à descoberta de uma verdade até então desconhecida;
. permitir a demonstração e a prova de uma verdade já conhecida;
. permitir a verificação de conhecimento para averiguar se são ou não verdadeiros.
O método é, portanto, um instrumento racional para adquirir, demonstrar ou verificar conhecimentos. Nas várias formulações que recebeu no correr da história da filosofia e das ciências, sempre teve o papel de um regulador do pensamento, isto é, de verificador e avaliador das ideias e teorias: guia o trabalho intelectual e avalia os resultados obtidos.
Desde Aristóteles, a filosofia considera que, ao lado de um método geral que todo e qualquer conhecimento deve seguir, outros métodos particulares são necessários, adequados à especificidade do objeto a ser conhecido. Dessa maneira, são diferentes entre si os métodos da geometria e da física, da biologia e da sociologia, e assim por diante.
É interessante notar, todavia, que, em certos períodos da história da filosofia e das ciências, chegou-se a pensar num método único para todos os campos do conhecimento. Assim, Galileu julgou que o método matemático deveria ser usado em todos os conhecimentos da natureza, pois dizia ele, "a natureza é um livro escrito em caracteres matemáticos".
Descartes, indo mais longe do que Galileu, julgou que um só método deveria ser empregado pela filosofia e por todas as ciências, uma mathesis universalis, ou o conhecimento da ordem necessária das ideias, válida para todos os objetos de conhecimento. Conhecer seria ordenar e encadear em nexos contínuos as ideias referentes a um objeto, e tal procedimento deveria ser o mesmo em todos os conhecimentos porque esse é o modo próprio do pensamento, seja qual for o objeto a ser conhecido.
Os filósofos e cientistas do fim do século XIX também afirmavam que um único método deveria ser seguido.Entusiasmados com o desenvolvimento da física, julgaram que todos os campos do saber deveriam empregar o método usado pela "ciência da natureza", mesmo quando o objeto fosse o homem. Agora, não era tanto o conceito de ordenamento interno das ideias que levava à defesa de um único método de conhecimento, mas o da causalidade ou da explicação causal de todos os fatos, fossem eles naturais, fossem humanos.
Cada campo com seu método: No século XX, porém, sobretudo com a fenomenologia de Husserl e com  a corrente do pensamento conhecida como estruturalismo, passou-se a considerar que cada campo do conhecimento deve ter seu método próprio. Este é determinado pela natureza do objeto, pela forma como o sujeito do conhecimento pode aproximar-se desse objeto e pelo conceito de verdade que cada esfera do conhecimento define para si própria.
Assim, por exemplo, considera-se o método matemático (dedutivo) próprio para objetos que existem apenas idealmente e que são construídos inteiramente pelo nosso pensamento. Ao contrário, o método experimental (indutivo) é próprio das ciências naturais, que observam seus objetos e realizam experimentos.
Já as ciências humanas têm métodos de compreensão e de interpretação do sentido das ações, das práticas, dos comportamentos, das instituições sociais e políticas, dos sentimentos, dos desejos, das transformações históricas, pois o homem, objeto dessas ciências, é um ser histórico-cultural que produz as instituições e o sentido delas. Tal é o que precisa ser conhecido.
No caso das ciências exatas (as matemáticas), o método dedutivo também chamado axiomático, porque o conhecimento parte de um conjunto de termos primitivos e de axiomas indemonstráveis que baseiam a construção e demonstração nos objetos.
No caso das ciências naturais, o método indutivo também é chamado experimental e hipotético. Experimental porque se baseia em observações e experimentos; hipotético porque os cientistas partem de hipóteses sobre os objetos que guiam os experimentos e a avaliação dos resultados.
No caso das ciências humanas, o método é chamado compreensivo-interpretativo, porque seu objeto são as significações ou os sentidos dos comportamentos, práticas e instituições produzidas pelos seres humanos.
Atualmente, quatro traços são comuns aos diferentes métodos filosóficos:
1. o método é reflexivo - parte da autoanálise ou do autoconhecimento do pensamento;
2. é crítico - investiga os fundamentos e as condições da possibilidade do conhecimento verdadeiro, da ação ética, da criação artística e da atividade política;
3. é descritivo - descreve as estruturas internas ou essências de cada campo de objetos do conhecimento e das formas de ação humana;
4. é interpretativo - busca as formas da linguagem e as significações ou os sentidos dos objetos, dos fatos, das práticas e das instituições, suas origens e transformações.

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